Localização inventarial: inv. 225
Em 1909, Lionello Venturi decifrou o tema deste quadro. Sua fonte textual é Heródoto que, no início da História (I,7-8), narra as causas remotas dos conflitos que opõem a Grécia à Ásia em inícios do século V a.C..
Heródoto introduz, neste contexto, a lenda de Candaule (século VII a.C.), tirano de Sárdis, capital do antigo reino da Lídia (na atual Turquia). Perdidamente apaixonado por sua esposa, Rodope, que ele considerava a mais bela mulher existente, Candaule decide mostrá-la a seu guarda de corpo, Giges, para que seus próprios olhos o convençam desta beleza superlativa. E o introduz secretamente em sua alcova. Mas Rodope apercebe-se de sua presença e vinga-se da humilhação a ela infligida pelo marido. Encontra-se sucessivamente com Giges e obriga-o, sob pena de morte, a matar Candaule em seu leito e a casar-se com ela.
O quadro de Dossi é possivelmente o primeiro a representar este tema e talvez mesmo o único no século XVI. Em todo o caso, ele retornará com alguma frequência entre os séculos XVII e XIX. Dosso Dossi figura-o de modo totalmente discrepante da narrativa de Heródoto, já que a exibição da nudez de Rodope não se dá aqui através de qualquer subterfúgio.
Embora se desconheçam as circunstâncias de sua encomenda e execução, seria interessante vincular este pequeno quadro à precoce manifestação do tema do voyeurisme que emerge na pintura vêneto-lombarda a partir sobretudo do terceiro decênio, em particular com Giulio Romano.
Trata-se de um raro momento de irradiação da poética de Giorgione sobre o jovem Dosso Dossi, como já propunha Roberto Longhi em 1928.
Luiz Marques
28/06/2010
Bibliografia
K. Hermann Fiore, in J. Bentini, S. Guarino, Il Museo senza confini. Dipinti ferraresi del Rinascimento nelle raccolte romane. Catálogo da exposição. Milão, Federico Motta, p. 130