O escultor italiano Giulio Monteverde (1837 – 1917) tornou-se muito conhecido pelo grupo “Edoardo Jenner experimenta em seu filho a inoculação da vacina”(1873). A obra tem por tema o cientista e médico que sacrifica o próprio filho, em nome da ciência. Ligava-se às idéias do Positivismo, no culto à ciência e ao progresso.
Um comentário sobre a obra foi publicado em um artigo da Gazeta de Notícias do Rio de Janeiro, em 27 de novembro de 1878, assinado pelo crítico português Ramalho Ortigão, uma das principais figuras ligadas ao realismo em seu país. Ele aborda a seção italiana da Exposição Universal de 1878, em Paris, e destaca entre os trabalhos apresentados a escultura de Monteverde. Para o crítico, a arte para se renovar deve voltar-se ao povo e assim tornar-se liberta dos rígidos modelos acadêmicos:
Só impulso geral de um povo tem o poder de suscitar um renascimento esthetico. É o povo portanto que os artistas devem interrogar para descobrir o novo caminho que são chamados a percorrer, a intervenção acadêmica e dogmática não fará senão affastá-los cada vez mais do seu destino progressivo…
Para tanto, é preciso que o artista apresente uma nova postura, buscando originalidade de concepção e de estilo. Segundo ele, o Jenner de Monteverde é uma excepção luminosa e brilhante (…) um pobre cirurgião d`aldeia, sentado n`uma cadeira, com a lanceta em punho, as pernas cruzadas, um pé sobre o outro, experimenta a vacina que acaba de descobrir, inoculando-a no braço de seu filho.
Para Ortigão, a atitude da criança nua colocada sobre os joelhos do pai e debruçada sobre o seu braço esquerdo é cheia de naturalidade e graça. A ação do cientista, de uma simplicidade grandiosa, exprime admiravelmente a concentração de seu espírito, a convicção de sua inteligência, a decisão de sua vontade. Para ele, o mais tocante na obra é o clima de intimidade doméstica que apresenta e sobretudo o tema, que tem um amplo sentido social:
Entre tantas estatuas de reis, de principes, de papas, de guerreiros, é summanamente consolador o encontrarmo-nos defronte da admirável imagem do descobridor da vaccina, a occasião de nos inclinarmos reverentemente e reconhecidamente aos pés de um homem util, que nunca teve no mundo nem um altar, nem um throno e que todavia dominou um dos maiores flagellos da natureza, em vez de dominar o homem, espingardeando-o ou corrompendo-o.
Maria do Carmo Couto da Silva
18/02/2010
Bibliografia
JANSON, Horst W. Nineteenth century sculpture. London: Thames and Hudson, [c.1985]. p.85-87.
ORTIGÃO,Ramalho. Notas de Viagem: as nações artistas. Gazeta de Notícias. Rio de Janeiro ano 4, n.328, p.1, 27 nov. 1878.