“Em 1299, Donato di Arnoldo Peruzzi, patriarca de uma família de banqueiros florentinos, deixa fundos em seu testamento para uma Capela familiar no transepto da igreja de Santa Croce, a qual devia ser completada em menos de dez anos.
Seu neto, Giovanni di Rinieri Peruzzi, encarregar-se-á da construção e da decoração desta Capela, a segunda à direita a partir do altar, iluminada por uma janela em bífora, decorada com vitrais.
Os afrescos que a decoram são unanimemente atribuídos a Giotto di Bondone (1266-1337). Já Lorenzo Ghiberti, nos I Commentarii (1446-1447) refere-se à intensa atividade do artista na igreja franciscana de Florença:
Nell´ordine de´ frati minori [dipinse] quattro cappelle e quattro tavole.
“”Na igreja da ordem dos frades menores [pintou] quatro capelas e quatro quadros””.
Não há mais vestígios dos afrescos giotttescos das Capelas Tosinghi-Spinelli e Giugni, enquanto em outras duas capelas – Bardi e Peruzzi – eles se conservaram, ainda que, sobretudo na Capela Peruzzi, em muito mau estado de conservação, devido ao fato das pinturas serem em muitas partes pintadas a secco.
Também Giorgio Vasari (1550 e 1568), refere-se à atividade de Giotto nas quatro capelas de Santa Croce. Acerca da Capela Peruzzi, escreve:
“”Na outra [Capela], da família dos Peruzzi, há duas histórias da vida de S. João Batista, a quem é dedicada a capela, onde se vê muito vividamente o bailar e saltar de Herodíade e a prontidão de alguns serventes ao servir à mesa. Na mesma capela há duas histórias de S. João Evangelista, maravilhosas, representando quando ressuscita Drusiana e quando é arrebatado ao céu””.
A execução na Capela Peruzzi de pinturas murais em que se conjuga afresco e têmpera não é prática habitual em Giotto, considerado por Cennino Cennini como modelar na observância do afresco “”legítimo””.
Poder-se-ia explicá-la seja pela urgência em se cumprir o prazo de dez anos imposto pelo testamento de Donato Peruzzi, seja pelo acúmulo de encomendas a que Giotto estava sujeito, seja, enfim, porque – é a hipótese de Giovanni Previtali [1967/1974:107] – Giovanni Peruzzi desejava-a pronta por ocasião da visita a Florença em 1310 de Roberto d´Anjou, rei de Nápoles, que se hospedou em sua casa.
Os afrescos foram recobertos em data ignorada e descobertos em 1841. O radical restauro realizado em 1959-1961 por L. Tintori, sob a direção de U. Procacci e E. Borsook, ao remover todas as repinturas, foi objeto de áspera controvérsia, e em 1967, G. Previtali escrevia: “”se quisermos imaginar um restaurador sádico (ou, simplesmente, norte-americano)””…
O ciclo Peruzzi é construído sobre o paralelismo entre as vidas de S. João Batista e S. João Evangelista, em parte decerto por causa do nome de seu comitente
Segundo a Legenda aurea de Jacopo da Varagine, em cujo texto parece se basear a iconografia destes afrescos, os dois santos tinham uma data coincidente, 24 de junho, correspondente à ascensão do Evangelista e ao nascimento do Batista. A presença de afrescos dedicados ao Batista liga-se, enfim, à particular devoção que Florença lhe dedicava.
Três cenas sobre a parede esquerda são devotadas a S. João Batista: 1. O Anúncio a Zacarias; 2. Nascimento do Batista; 3. O Festim de Herodes e a apresentação da cabeça do Batista.
Três cenas sobre a parede direita o são ao Evangelista:
1. S. João na ilha de Patmos; 2. A Ressurreição de Druisina; 3. Ascensão
A datação destes afrescos é extremamente árdua e suscitou desde sempre debates, ainda inconclusos. A proposta que parece ser a mais convincente é a de Giovanni Previtali que os data de inícios do ségundo decênio, entre 1310 e 1313, logo após os afrescos da Capela da Madalena na Basílica inferior de Assis (1308-1309).
De forma geral, sugerem-se para estes afrescos datações mais tardias, por volta dos anos em torno de 1320, isto é, em um momento imediatamente anterior aos afrescos da Capela Bardi (1320-1325).
Luiz Marques
13/01/2011
Bibliografia:
1967 – G. Previtali, Giotto e la sua bottega. Milão, Fratelli Fabbri, 1974, p. 106.
1976 – B. Cole, Giotto and Florentine Painting 1280-1375. new York, Harper e Row, p. 108
1977 – E. Baccheschi, L´Opera Completa di Giotto. Milão, Rizzoli, p. 113
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