“Registro inventarial: The Trustees of the British Museum,
inv. 56, 6-23, 4-7
Um dos quatro alto-relevos de marfim, todos conservados no
British Museum, esculpidos à maneira tardo-imperial, quase
em ronde-bosse, e nos quais nada mais resta da
cultura clássica. Trata-se de prováveis revestimentos de um
pequeno cofre ou relicário, similar ao mais famoso Relicário
de Brescia.
Os relevos representam cenas da Paixão, Morte e Ressurreição
de Cristo:
1. Pilatos lavando as mãos, Subida ao Calvário e Denegação
de Pedro;
2. Crucificação e Suicídio de Judas;
3. Ressurreição;
4. Incredulidade de S. Tomé.
Após o grafite blasfematório de Alexamenos*, proveniente do
Paedagogium do Palatino e datável da primeira metade
do século III (Roma, Museo delle Terme, Palazzo Massimo) –
vide: http://www.mare.art.br/detalhe.asp?idobra=2746
– esta é decerto a mais antiga representação conservada da
Crucificação de Cristo, posto que anterior ainda aos relevos
da porta de Santa Sabina, em Roma. Como se sabe, a
crucificação era um tema não-grato aos cristãos dos
primeiros séculos, já que a condenação à morte na cruz era
considerada ignominiosa e reservada a criminosos destituídos
da cidadania romana.
A irônica inscrição sobre a cruz “”IREX IUD[aeorum]”” (Jesus
Rei dos Judeus) advém de Lucas 23,38. O Cristo, vivo e
impassível, com o nimbo não-cruciforme, é o Christus
triumphans, isto é, que triunfa sobre a morte. O pássaro
alimentando os filhotes sobre a árvore simboliza justamente
a vida eterna oferecida aos homens pelo sacrifício. Do mesmo
galho dessa árvore pende Judas, enforcado, com os trinta
dinheiros aos pés, figura da
Esta representação da Crucificação como um triunfo, ainda
próxima da simbólica dos triunfos romanos, é comum na
literatura coeva, tal como, por exemplo, na 85ª das Homilias
sobre o Evangelho de João (19.16-20.9) de S. João Crisóstomo
(85:1), arcebispo de Constantinopla, datável de 389, na qual
Cristo é comparado ao Imperador triunfante:
“”[Cristo] saiu levando a cruz como um troféu contra a
tirania da morte. Como os vencedores, ele levava sobre si o
símbolo da vitória””.
As personagens coadjuvantes da cena são a Virgem, João e
Longinus no ato de desferir o golpe da lança (não
conservada).
Luiz Marques
05/05/2010
Bibliografia:
1952 – W.F. Volbach, Elfenbeinarbeiten der Spätantike und
des frühen Mittelalters. 3. ed., Mainz: Romisch-Gemanischen
Zentralmuseums, 1976, n. 116.
1978 – K. Weitsmann (ed.), Age of Spirituality. Late Antique
and Early Christian Art, Third to Seventh Century. Catálogo
da exposição, New York, The Metropolitan Museum of Art.
Princeton Univ. Press, pp. 502-503.
“