Marcos 16,9 apenas menciona a cena, enquanto João, 20,11-18 nela se detém:
“Maria estava junto ao sepulcro, de fora, chorando. Enquanto chorava, inclinou-se para o sepulcro e viu dois anjos, vestidos de branco, sentados no lugar onde o corpo de Jesus fora colocado, um à cabeceira e outro aos pés. Disseram-lhe então: ´Mulher, por que choras?´. Ela lhes diz: ´Levaram o meu Senhor e não sei onde o colocaram!´
Dizendo isto, voltou-se e viu Jesus de pé. Mas não sabia que era Jesus. Jesus lhe diz: ´Mulher, por que choras? A quem procuras?´ Pensando ser ele o jardineiro, ela lhe diz: ´Senhor, se foste tu que o levaste, dize-me onde o puseste e eu o irei buscar!´ Diz-lhe Jesus: ´Maria!´. Voltando-se, ela lhe diz em hebraico: Rabbuni!, que quer dizer Mestre. Jesus lhe diz: ´Não me retenhas, pois ainda não subi ao Pai´”.
Foi observada (Réau) a contradição entre este interdito do contato físico e a cena sucessiva do toque da chaga de Cristo por S. Tomás, contradição explicada em geral por um erro de tradução: Me aptou mou, melhor que Noli me tangere, deve ser traduzido por “Não te apegues a mim”.
Trata-se de uma das 36 cenas do ciclo cristológico que ornava o verso da grande Maestà com Santos e Anjos encomendada a Duccio di Buoninsegna (Siena, 1255-1319) em 1308 para o altar da Catedral de Siena. Terminada em 1311, ela representa talvez a obra-prima da pintura sobre madeira na história da arte do século XIV.
A composição em diagonal ascendente colhe o momento em que a figura e a voz da Madalena unem-se no grito de reconhecimento do amado: “Rabbuni!”, após ouvir sua voz emocionada. O contato já não é, contudo, possível, pois Jesus transmutou-se, como bem sugere o grafismo abstrato e bizantinizante de suas vestes, recortado como uma iluminura sobre o pedregoso do fundo.
Luiz Marques
07/02/2010
Bibliografia:
1957 – L. Réau, Iconographie de l`art chrétien, volume II, trad. esp., I,2, p. 579.