Registro inventarial: Kress Collection inv. n. 414
A partir do texto da Legenda aurea (127-132) de Jacopo de Varazze, cujos manuscritos começam a circular em finais do século XIII, surgem na Itália, após a Peste Negra (1348-1351), as primeiras representações visuais do martírio de S. Sebastião, ligadas, como se sabe, à função apotropaica do santo.
Mas é só a partir de meados do século XV que se fixa o tipo de São Sebastião como um efebo imberbe e delicado, espécie de Adonis cristão, cuja escultórica beleza – excelente ocasião para a imitação dos torsos antigos – não é crispada pelas flechas.
Após o áspero retábulo de Antonio Pollaiuolo dos anos 1470, são as representações mais doces e impassíveis de Perugino, cuja versão principal conserva-se no Louvre, que dominam a iconografia a que se filia a presente obra do jovem Amico Aspertino (1474-1552).
A abundância de testemunhos da cultura clássica atesta o impacto da estada romana de Aspertini em 1496 e a obra não deveria datar de um momento muito sucessivo a esta estada, contrariamente a propostas anteriores que a situavam em 1504 ou 1505.
A coluna rompida é signo convencional da superação da cultura pagã. Já o relevo em grisaille da balaustrada ou do sarcófago sobre o qual estranhamente se apoia a figura representa um tema de significado obscuro e talvez em relação de equivalência simbólica com o martírio do santo.
Dividido em três seções aparentemente autônomas e compostas por grupos de 2 ou 3 figuras, o relevo central foi objeto de diversas interpretações, com prevalência para um paralelo com o mito de Céfalo e Procris, proposto no Catálogo preliminar da National Gallery, de 1941.
A partir de uma indicação oral de Panofsky a Phyllis Pray Bober [1957:34], a estudiosa norte-americana sugeriu que o relevo central poderia representar o mito de Níobe, o extermínio de sua prole e sua transformação em estátua de pedra (Apolodoro, Biblioteca, II,1,1), proposta que teria em princípio o mérito de certa relação com o similar extermínio produzido pela peste.
Os relevos laterais seriam apenas, segundo Bober, “referências gerais ao paganismo”: à esquerda um Hércules fruindo do canto da Musa representaria sua virtus e a prática da música e da poesia, realizações “acessíveis mesmo aos pagãos”, enquanto, à direita, Aspertini haveria representado o culto dos falsos deuses. De forma geral, conclui a estudiosa, “estes empréstimos de diversos motivos antigos (…) revela pouca compreensão do estilo clássico