Iracema, de Antonio Parreiras, representa a passagem escolhida também por José Maria de Medeiros, em quadro homônimo de 1884*.
Parreiras pintou a heroína poucos momentos após ela encontrar uma flecha fincada no chão, com um caranguejo e um ramo de maracujá atravessados. A índia desaba em profunda tristeza, ajoelhando-se diante do que na verdade era uma mensagem de Martim, seu amante português, dizendo-lhe que o esqueça.
Parreiras solucionou de forma simples e inteligente o que foi apontado por diversos críticos como um dos problemas mais graves do quadro de Medeiros: a reação de Iracema após o encontro da flecha.
Segundo o catálogo da Exposição Geral de 1884, a índia de Medeiros caminha para trás, mas sua pintura não parece transmitir essa ideia. A solução de Parreiras, então, foi imobilizar Iracema, escondendo-lhe o rosto e acentuando não só o drama como a presença do corpo da indígena.
Ainda de forma admirável, o corpo contrasta com o ambiente radioso que o cerca, mimetizando ao mesmo tempo seus tons de areia. Embora um pouco modificada, essa pose de Iracema pode ser vista também em diversas obras do período, como na escultura Cristo e a mulher adúltera (1884), de Rodolfo Bernardelli, e o quadro Arrufos (1887), de Belmiro de Almeida. Ambas as obras representam mulheres tristes ou em desamparo, ainda que no caso de Arrufos a tristeza possa ser encenada.
Outro quadro de Parreiras a retratar uma índia em posição semelhante é “A morte de Estácio de Sá”, de 1911. Aos pés de um imponente chefe Arariboia, ela cumpre o papel imputado frequentemente às mulheres, em tal gênero de representação: o de carpideira e, quiçá, enamorada do herói agonizante.
Alexander Gaiotto Miyoshi
18/03/2011
Bibliografia:
2000 – V. Salgueiro (org.), Antônio Parreiras: notas e críticas, discursos e contos – coletânea de textos de um pintor paisagista, vol. 39. Niterói: EdUFF.
2001 – L. Marques, 30 Mestres da Pintura no Brasil. Catálogo de exposição. Rio de Janeiro, Museu Nacional de Belas Artes, pp. 101-102.
2006 – L. Motta, Antonio Parreiras: a trajetória de um pintor através da crítica de sua época. Dissertação de Mestrado. Campinas: IEL Unicamp.
2007 – V. Salgueiro, “Construindo a origem, as virtudes e os heróis na pintura de História: o caso da obra A morte de Estácio de Sá, de Antônio Parreiras”. Anais do Museu Histórico Nacional, 39. Rio de Janeiro: MHN, pp. 129-146.